CARMEN SANTOS - A MULHER MAIS IMPORTANTE DO CINEMA MUDO BRASILEIRO


Segundo Alice Gonzaga, quando perguntavam ao seu pai, Adhemar Gonzaga, um dos homens mais importantes dos primórdios do cinema brasileiro, quem ele considerava a mulher mais relevante desse período, ele respondia imediatamente: Carmen Santos. E com toda razão. Carmen não apenas produzia os filmes que estrelava, como também foi fundadora de um estúdio de cinema. Contudo, só se aventurou na direção de um filme anos depois. Além disso, esteve envolvida com os maiores nomes da produção cinematográfica daquele período, como o próprio Adhemar Gonzaga, Humberto Mauro e Mário Peixoto.

Nascida em Portugal, Carmen chegou ao Brasil em 1912. Sua estreia como atriz aconteceu em "Urutau", filme que, infelizmente, nunca chegou a ser exibido para o grande público e acabou se perdendo com o tempo. Mesmo sem atingir a audiência em geral, Carmen encantou os poucos que tiveram o privilégio de vê-la atuar. Em 1924, participou de seu segundo filme, "A Carne", outra obra que não foi exibida ao público devido a um incêndio que destruiu os negativos. Foi com esse filme que Carmen deu início à sua carreira como produtora, financiando e participando de seus próprios projetos.

Em 1929, Carmen estrelou e produziu "Sangue Mineiro", uma das produções mais importantes do cinema mudo brasileiro, embora não tenha sido bem recebida na época de seu lançamento. No ano seguinte, participou de "Limite", dirigido por Mário Peixoto. Apesar de ter sido inicialmente ignorado, o filme tornou-se uma obra cultuada, inclusive internacionalmente, nos anos posteriores.

Já em 1925, Carmen havia organizado uma produtora de filmes ao lado de Adhemar Gonzaga. Em 1934, foi uma das fundadoras da Brasil Vox Filme, que mais tarde se tornaria a Brasil Vita Filmes. O estúdio foi responsável por produções como "Favela dos Meus Amores" e "Cidade Mulher". Em 1937, Carmen começou a planejar seu trabalho mais ambicioso: "Inconfidência Mineira", baseado na história de Tiradentes. A produção teve início em 1941, e Carmen investiu todos os seus bens no projeto. As filmagens ocorreram em São João del Rei. Além de produzir, Carmen dirigiu e atuou no filme, interpretando Bárbara Heliodora, uma figura histórica que foi poetisa, mineradora e ativista política no Brasil.

Lançado em 1948, "Inconfidência Mineira" enfrentou inúmeros desafios durante sua produção, distribuição e exibição. O filme foi recebido com frieza pela crítica e pelo público. Carmen foi duramente criticada por seu trabalho como diretora, sofrendo ataques machistas. Um crítico chegou a escrever que "ela deveria se afastar dos filmes, pois não aceitava ser controlada por um diretor que a colocasse em seu devido lugar". Em outras palavras, insinuava que Carmen deveria apenas atuar e deixar a direção para os homens – uma crítica semelhante à enfrentada por Cléo de Verberena, a primeira mulher a dirigir um filme no Brasil, anos antes. Posteriormente, os negativos originais de "Inconfidência Mineira" também foram perdidos.

Carmen Santos era uma defensora incansável do cinema brasileiro e deixou clara sua paixão em uma entrevista:

"O cinema brasileiro é esse formigueiro imenso, espalhado por todos os cantos do Brasil, lutando contra todas as adversidades e, pior do que isso, contra a descrença dos que põem em dúvida o seu ideal. Cinema brasileiro é sincero, é livre, tem a sua língua e personalidade. Quer apenas viver sozinho no coração dos brasileiros. Ele tem esse direito pela continuidade de esforços de seus heróicos pioneiros e pela sua finalidade patriótica de concorrer para a propaganda e o engrandecimento do Brasil, contribuindo para a educação do povo e para a perpetuidade de nossa língua."

Carmen faleceu em 24 de setembro de 1952. Apesar de anos de esquecimento, seu legado e importância para o cinema brasileiro foram redescobertos. Obras sobreviventes, como "Sangue Mineiro" e "Argila", permitem vislumbrar um pouco da atriz e mulher fascinante que ela foi – uma figura sempre comprometida com a luta pelo cinema nacional e pela elevação da qualidade das produções brasileiras.

FONTE:
Texto de Alice Gonzaga sobre Carmen Santos publicado na revista Filme Cultura
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PDF contendo o texto integral, entre outros artigos 


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