UM RESUMO SOBRE O CINEMA MUDO BRASILEIRO

Aitaré da Praia (1925)

Os primórdios do cinema brasileiro são obscurecidos pela falta de informações e pela escassez de materiais preservados, o que dificulta uma narrativa clara e contínua de sua história. No entanto, ao reunir os fragmentos disponíveis, é possível compreender a importância do cinema em nosso país nos primeiros períodos, quando era um entretenimento exclusivo para pessoas ricas, antes de se tornar acessível a outras classes sociais com o passar do tempo.

Em 8 de julho de 1896, ocorreu a primeira exibição pública cinematográfica no Brasil, um evento testemunhado principalmente pela elite, com a exibição de curtas europeus. Essa exibição de oito pequenos curtas aconteceu na Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro. Embora "Chegada do Trem em Petrópolis", filmado em 1897, seja considerado uma das primeiras produções brasileiras, há rumores de que as filmagens tenham sido realizadas fora do país. Por outro lado, "Bailado de crianças no colégio, no Andaraí", do italiano Vittorio di Maio, é considerado o primeiro filme com cenas genuinamente brasileiras.

As primeiras produções brasileiras tinham um caráter documental, assim como as produções americanas da época. "A Vista da Baía de Guanabara", realizado em 1898, é considerado o primeiro documentário produzido no país. Os costumes indígenas foram retratados em "Rituais e Festas Borôro", de 1917.

Em 1º de maio de 1897, no Cassino Fluminense, ocorreu a primeira exibição de curtas brasileiros. Foram exibidos "Chegada do Trem em Petrópolis", "Bailado de Crianças no Colégio, no Andaraí", "Uma Artista Trabalhando no Trapézio do Politeama" e "Ancoradouro de Pescadores na Baía de Guanabara", entre outros. Essa exibição seguiu os moldes das sessões dos irmãos Lumière em Paris e novamente contou com a presença da elite. Dos filmes exibidos, apenas alguns fotogramas de "Ancoradouro de Pescadores na Baía de Guanabara" foram preservados, tornando-o um dos materiais cinematográficos brasileiros mais antigos.

Os irmãos italianos Paschoal e Affonso Segreto foram figuras proeminentes nesse período. Affonso filmou "Vista da Baía de Guanabara", tornando-se um dos primeiros cinegrafistas do cinema brasileiro. Paschoal, por sua vez, era um grande investidor do Teatro de Revista. Em 1898, ele lançou a Animatographo, considerada a primeira revista brasileira sobre cinema. Embora tenha durado apenas quatro edições, foi importante para o surgimento de diversas revistas posteriores. Paschoal também inaugurou a primeira sala de cinema brasileira em 1897, no Rio de Janeiro. A primeira sala de cinema de São Paulo foi aberta em 1907 por Francisco Serrador e Antônio Gadotti, chamada de Cine Bijou-Theatre. Assim como no Rio, as salas de cinema de São Paulo eram frequentadas pela elite da época.

Entre 1907 e 1910, com a melhoria do fornecimento de energia elétrica no país, o número de locais de exibição de filmes se multiplicou. Esses locais, em sua maioria, exibiam filmes estrangeiros. Com a popularização dos filmes estrangeiros de ficção, o país começou a produzir suas próprias obras ficcionais. "Os Estranguladores", realizado em 1908, foi uma das primeiras obras desse novo período. Era comum que muitos dos projetos realizados fossem baseados em casos reais, como "O Crime da Mala", de 1908, e havia produções focadas em outros gêneros, como a comédia, exemplificada por "Nhô Anastácio Chegou de Viagem".

Em 1910, o primeiro estúdio brasileiro foi fundado no Rio de Janeiro pelo italiano Giuseppe Labanca.

Inspirados pelos filmes estrangeiros, começaram a ser produzidos filmes mudos musicais que eram acompanhados por performances musicais ao vivo durante a exibição. "Paz e Amor", de 1910, foi um desses exemplos, tornando-se um grande sucesso. Hoje, esse filme é considerado perdido. Em 1914, foi produzido "O Crime dos Banhados", o primeiro longa-metragem brasileiro, com mais de duas horas de duração.

A partir de 1915, houve uma grande produção de adaptações cinematográficas de obras literárias brasileiras, incluindo "Inocência" (1915), "A Viuvinha" (1915), "Lucíola" (1916), "O Guarani" (1916), "Iracema" (1918) e "Ubirajara" (1919). Em 1916, os cinejornais tornaram-se populares, abordando assuntos como futebol, notícias e vida social.

A partir de 1911, a produção brasileira de filmes enfrentou um novo desafio: Hollywood. Executivos dos estúdios americanos começaram a visitar o Brasil para conhecer as produções cinematográficas locais e abrir cinemas para a exibição de filmes estrangeiros, o que desencadeou uma rivalidade que levou à perda de interesse do público pelas produções nacionais e a uma queda na produção de filmes brasileiros.

Em 1917, foi produzida a primeira animação brasileira: "O Kaiser", dirigida pelo cartunista Álvaro Marins, conhecido como Seth. Anteriormente, vinhetas animadas eram exibidas nos encerramentos dos cinejornais, mas "O Kaiser" foi a primeira animação genuinamente brasileira.

Durante o período do cinema silencioso, a maioria dos filmes era produzida entre São Paulo e Rio de Janeiro, mas outros estados também se aventuraram na produção cinematográfica e contribuíram para o crescimento do cinema nacional na época. Em Pelotas, Rio Grande do Sul, foram produzidos "Os Óculos do Vovô" em 1913 e "O Crime dos Banhados" em 1914. Em Recife, "Aitaré da Praia" (1925) é um dos principais filmes do período, tendo sido exibido até no Rio de Janeiro.

O ciclo de Cataguases, em Minas Gerais, é reconhecido como um dos mais memoráveis e significativos para a produção cinematográfica brasileira, pois revelou talentos como Humberto Mauro, que se tornaria um dos mais importantes diretores do país, além de Pedro Comello, também fotógrafo, o produtor Humberto Cortes Domingues, o fotógrafo Edgar Brasil e as atrizes Eva Nil (filha de Pedro Comello) e Nita Ney. Durante esse período, foi estabelecida a Phebo Brasil Filmes, que se tornou uma das produtoras mais relevantes da época.

Durante o ciclo de Cataguases, foram produzidos filmes como “Tesouro Perdido” (1926), “Na Primavera da Vida” (1926), “Braza Dormida” (1928) e “Sangue Mineiro” (1929), elevando o prestígio de Humberto Mauro como um dos melhores diretores do país. Isso culminou em sua mudança de Minas Gerais para o Rio de Janeiro, marcando o encerramento desse ciclo e da Phebo Brasil Filmes.

A transição do cinema mudo para o falado no Brasil ocorreu em 1929, com “Acabaram-se os Otários”, o primeiro filme sonoro. Mesmo com a chegada do som às películas, filmes mudos continuaram a ser produzidos. Um exemplo é “Limite”, dirigido por Mario Peixoto, lançado em 1931, em meio à novidade dos filmes falados. Embora seu lançamento tenha passado despercebido, o filme tornou-se cultuado ao longo dos anos como uma obra-prima.

Ainda em 1931, “O Mistério do Dominó Preto” trouxe Cléo de Verberena como a primeira mulher a dirigir um filme até então. Antes disso, Carmen Santos era uma das poucas atrizes a participar da produção de seus filmes, embora não estivesse envolvida na direção. Antes de fundar o estúdio Brasil Vita Filmes, Carmen fundou a F.A.B. (Films Artístico Brasileiro), uma espécie de agência para divulgar seus trabalhos e projetos. Somente na década de 40, ela decidiu dirigir um filme.

Em 1933, “Ganga Bruta”, de Humberto Mauro, que inicialmente seria um filme mudo, passou a ter diálogos sonoros devido à crescente popularidade dos filmes sonoros durante sua produção. A partir desse período, o cinema brasileiro passou por mais uma grande transformação na arte de produzir filmes. Com a popularização dos filmes sonoros, o auxílio das revistas de cinema, o estabelecimento de grandes estúdios como Vera Cruz e Atlântida, e a chegada das chanchadas, o cinema mudo foi gradualmente esquecido, sendo resgatado nas últimas décadas, embora tenha sofrido com a perda de filmes e informações valiosas para o resgate completo de sua história.



NOTAS
Devido a desencontros em algumas informações, fui obrigado a selecionar a que considerasse mais correta para seguir com o texto.

Uma das minhas fontes credita errada a data da primeira exibição cinematográfica no Brasil.

Um exemplo é "Vista da Baía da Guanabara", que em alguns textos é considerado o primeiro curta brasileiro. No entanto, outras fontes questionam sua existência, argumentando que não há informações de que tenha sido exibido ao público, podendo nunca ter existido ou ter sido apenas um curta gravado e exibido para um número limitado de pessoas.

Em algumas fontes, "Chegada do Trem em Petrópolis", "Bailado de Crianças no Colégio, no Andaraí", "Uma Artista Trabalhando no Trapézio do Politeama" e "Ancoradouro de Pescadores na Baía de Guanabara" são consideradas as primeiras produções brasileiras, ignorando totalmente "Vista da Baía da Guanabara".

Existem controvérsias sobre o local de gravação de "Chegada do Trem em Petrópolis".


FONTES
https://aventurasnahistoria.uol.com.br/noticias/daniel-bydlowski/qual-foi-primeira-exibicao-de-cinema-no-brasil.phtml

https://brasilescola.uol.com.br/cultura/cinema-brasileiro.htm

https://www.todamateria.com.br/historia-do-cinema-brasileiro/

https://www.tribunapr.com.br/mais-pop/primeira-sessao-de-cinema-do-brasil-completa-115-anos/

https://www.aicinema.com.br/a-historia-do-cinema-brasileiro/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Cinema_do_Brasil#:~:text=Affonso%20Segretto%2C%20junto%20aos%20primeiros,exibidor%20itinerante%20belga%20Henri%20Paillie.

https://bases.cinemateca.org.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=FILMOGRAFIA&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=ID=000205&format=detailed.pft#1

https://bases.cinemateca.org.br/cgi-bin/wxis.exe/iah/?IsisScript=iah/iah.xis&base=FILMOGRAFIA&lang=p&nextAction=lnk&exprSearch=ID=000202&format=detailed.pft#1


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