Produzido durante o Pre-Code, "Mulher e Médica" (Mary Stevens, M.D.) é um excelente clássico do período, mostrando como era o papel da mulher na sociedade na época. Logo no início do filme, há uma cena onde a Dra. Mary Stevens (Kay Francis), vai fazer um parto e é ameaçada de morte pelo pai da criança que não admite o fato de uma mulher ser médica e fazer o parto de seu filho. Obviamente, Mary faz um excelente trabalho, deixando o pai surpreso ao ver que na realidade sua esposa esperava duas crianças, ambas nascidas saudáveis. A partir desse momento, o filme mostra a luta de Mary por respeito e reconhecimento em sua profissão. Vários pacientes se recusam a serem tratados por ela, pelo fato dela ser mulher. Com o tempo, ela prova para todos que está ali por sua competência e passa a ser respeitada, porém mais a frente ela terá que lidar com um outro estigma: o de mãe solteira, mas vamos por partes.
Mary e seu amigo Don (Lyle Talbo) se conhecem há muito tempo, estudaram Medicina juntos, formaram-se juntos e abriram um consultório juntos. Mary é apaixonada por Don, mas não consegue expressar seus sentimentos. Don começa a namorar uma moça de família rica e visando subir na vida, casa-se com ela. A partir de então, Don abre seu próprio consultório, além de dar outro para Mary. Ele passa a se envolver em negócios ilícitos, roubando fundos, além de tornar-se um homem viciado em bebidas. Ele e Mary acabam tendo um desentendimento e rompem a amizade.
Um tempo depois eles se reencontram em uma viagem: ela fugindo de seus sentimentos e da saudade que sente dele e ele fugindo de um possível escândalo. Durante essa viagem, Mary toma coragem e expõe seus sentimentos e eles passam a ter um caso. Apaixonado e decidido a pedir o divórcio, Don novamente se separa de Mary para organizar sua vida, mas seu sogro não está disposto a deixá-lo livre de sua filha e então decide usar uma tática para evitar o divórcio, mesmo com sua filha dizendo que não ama Don e que possui um amante.
Mary descobre estar grávida e decide contar a Don, porém, antes, ele lhe diz que não poderá se separar de sua mulher, por ela estar grávida dele. Mary então, decide viajar e manter a gravidez em segredo. Mary dá a luz durante a viagem e torna-se uma mãe solteira. Para não ser descoberta, decide montar um processo de adoção do próprio filho. Ela encara toda a responsabilidade da maternidade sozinha, sem Don saber da verdade. Após ocorrer uma tragédia, Mary colocará sua vocação como médica em dúvida.
O filme é ousado por mostrar uma mulher em um ambiente onde ela não era bem-vinda e para ser respeitada, precisava impor-se e mostrar que estava ali por ser qualificada e capacitada. Após a personagem decidir ser mãe solteira, mostra todo o estigma que uma mulher sofria ao assumir sozinha o peso da maternidade. Mesmo sendo uma médica agora respeitada e qualificada, ela não poderia de forma alguma aparecer com um filho sem pai, a não ser que ela supostamente adotasse a criança. O estigma das mães solteiras foi muito explorado durante o cinema mudo, assim como durante o Pre-Code. Após a implantação da Censura em Hollywood, esse tema era abordado geralmente em comédias, onde na maioria das vezes uma mulher era confundida como uma mãe solteira. Em 1949, o assunto seria abordado de forma séria no filme "Mãe Solteira" (Not Wanted), dirigido por Ida Lupino.
Kay Francis, considerada a primeira rainha da Warner antes de Bette Davis, dá aqui um desempenho bastante sólido e comovente, com toda certeza uma de suas melhores atuações. Chega a ser revoltante lembrar que tempos depois ela seria boicotada por Jack Warner e nunca mais teria um papel de grande êxito em sua carreira. Mesmo após decidir produzir seus próprios filmes, ela contou com o boicote dos distribuidores e exibidores. Desiludida com a carreira, afastou-se de tudo, ficando doente e morrendo reclusa e solitária.
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