Rivalidade em Hollywood sempre rendeu vários assuntos e lendas. Na maioria das vezes, essas rivalidades consistiam apenas entre mulheres ou entre chefões de estúdio. A rivalidade entre os chefões, geralmente era encarada como algo que estimulava a luta pelo monopólio de Hollywood. A rivalidade entre as mulheres, geralmente era algo bastante explorado e ridicularizado pela mídia especializada em cinema. Como em todo terreno, haviam mulheres inteligentes, que enxergavam o tratamento machista que recebiam e estavam dispostas a mudar isso: Bette Davis foi uma dessas mulheres e também uma das vítimas do machismo do sistema. Durante sua carreira teve duas grandes rivais: Miriam Hopkins e Joan Crawford e junto delas, teve sua vida profissional arrastada para os tabloides de fofocas. Mas Bette bateu de frente com vários homens durante a sua carreira, mas isso é pouco comentado. Um desses homens, foi Jack Warner, ninguém menos que seu patrão e chefe dos estúdios Warner.
Durante toda sua carreira, Bette teve que se impôr, principalmente no início dela. Bette tinha um complexo de não se achar bonita e atraente e diversos homens da indústria, reforçaram isso. Então, Bette decidiu que deveria ser reconhecida como uma atriz talentosa e não como uma atriz bonita, sexy e vazia. Para ser respeitada, Bette teve que bater de frente com diversas pessoas, de diversas áreas: diretores, produtores, roteiristas, co-protagonistas. Para uma mulher destemida como Bette, bater de frente com o chefe do estúdio não era nada.
Após começar sua carreira em filmes medianos na Universal, Bette teve seu contrato com esta cancelado e se viu sem chances. Pensou em desistir, mas um contrato com a Warner renovou suas esperanças, porém sua vida não seria fácil dali por diante. Seu primeiro embate com Jack Warner se deu quando surgiu a oportunidade de Bette fazer seu primeiro grande papel: a garçonete Mildred de "Escravos do Desejo" (Of Human Bondage). A personagem era polêmica e diversas atrizes haviam recusado o papel. Mas para Bette isso seria um grande desafio, porém Jack não queria que Bette fizesse o filme por dois motivos: o primeiro por ser em outro estúdio (RKO) e o segundo pela personagem ter uma reputação nada convencional. Nesse embate, Bette acabou vencendo, mas amargou uma sabotagem que lhe impediu de ser indicada ao Oscar. Jack fez de tudo para que sua estrela não fosse indicada pelo papel e conseguiu, porém o júri achou tal atitude suja e votou em Bette, mesmo ela não estando entre as candidatas oficiais. Mesmo assim Bette acabou perdendo.
Perder o Oscar ao qual nem havia sido indicada oficialmente, não foi de fato uma coisa ruim para Bette. Seu desempenho e sua coragem foram bastante elogiados entre os críticos de cinema e as pessoas passaram a se interessar por ela. Para compensar o estrago anterior, Jack ofereceu para Bette o papel da autodestrutiva Joyce em "Perigosa" (Dangerous). Dessa vez, Bette foi indicada e venceu o Oscar na categoria de Melhor Atriz. Após fazer "A Floresta Petrificada" (The Petrified Forest), Bette sentiu que os papéis medíocres estavam voltando. Reconhecendo seu potencial, decidiu brigar diretamente com Jack Warner. Tal atitude foi vista como uma espécie de "suicídio artístico" já que anos antes Kay Francis, a então "rainha da Warner", decidiu fazer o mesmo e acabou sendo sabotada pelo resto de sua carreira como atriz.
Bette decidiu abandonar a Warner antes do término de seu contrato e foi para a Inglaterra fazer dois filmes. Tal atitude deixou Jack Warner possesso de ódio e os dois foram para a corte. Como era de se esperar, Bette perdeu a batalha e foi bastante ridicularizada tanto na audiência, quanto pela imprensa. Bette acabou não fazendo os dois filmes na Inglaterra e teve que retornar para a Warner e cumprir o seu contrato. Diferente de Kay Francis, Bette teve sorte. Sua atitude acabou rendendo um pouco de respeito de Warner e a partir de então, Bette passou a ter uma boa fase de ótimos papéis, chegando até a receber um segundo Oscar por "Jezebel".
Mas a relação da atriz com o chefe, permaneceu tumultuada. Sabendo da rivalidade entre Bette Davis e Miriam Hopkins, Jack decidiu reuni-las no filme "Eu Soube Amar" (The Old Maid). Como era de se esperar, os bastidores do filme renderam diversos artigos para as colunas de fofocas, inclusive uma foto das duas atrizes usando luvas de boxe, com o diretor do filme entre elas. Mesmo sofrendo todo esse desgaste, Warner reuniu as duas novamente anos depois em "Uma Velha Amizade" (Old Acquaintance), novamente rendendo um circo midiático entre as duas.
Durante a década de 40, Bette era a rainha da Warner e o nome no topo dos líderes de bilheteria do estúdio. E isso lhe dava certa segurança de sempre intervir na produção dos filmes que estrelava. Sempre questionava os diretores a respeito das técnicas de atuações utilizadas por eles, sempre estava em busca de alterações nos scripts a fim de melhorar o texto e sempre estava disposta a ajudar os colegas de trabalho, mesmo de forma não muito ortodoxa, o que muitas vezes era levado por outro lado e sempre rendiam tensões entre Bette e seus colegas.
Bette disse certa vez que um filme feito em clima de paz nos bastidores, sempre fracassava, então a maioria dos seus filmes, contavam com certas tensões por trás das câmeras, chegando até a causar prejuízos no orçamento de produção. Ao ver que Bette poderia ser mais gigante do que era, Warner tomou uma atitude bem drástica para "doma-la": contratou Joan Crawford, a mais famosa rival de Bette. E Joan Crawford, chegou ganhando um Oscar por "Mildred Pierce", filme que dizem que Bette havia recusado.
Mesmo com Joan Crawford como ameaça dentro do estúdio, Bette não se deixou abater. Ainda chegou a protagonizar alguns sucessos no estúdio e chegou a produzir "Uma Vida Roubada" (A Stolen Life). Como era de esperar, "Uma Vida Roubada" foi um fracasso de crítica, mas o motivo estava além do filme: Jack Warner pouco se importou em divulgar o filme, sua intenção era realmente que o filme de alguma forma fracassasse e que Bette desistisse de produzir filmes. E ele conseguiu isso. Naquela época, era tabu atrizes produzirem seus próprios filmes e praticamente todas as atrizes que o fizeram, fracassaram, pois tinham que enfrentam um poderoso esquema liderado pelos chefões de estúdio. Mesmo não fazendo sucesso entre os críticos, o filme lucrou em torno de dois milhões de dólares.
Durante a segunda metade da década de 40, o desgaste entre Bette e Jack Warner, tornou-se mais evidente. Os roteiros fracos e os papéis medíocres retornaram. O ápice do desgosto ocorreu com "A Filha de Satanás" (Beyond the Forest) de 1949, filme que Bette literalmente fez obrigada e ela não fez questão alguma em esconder isso. Sua própria atuação no filme entrega isso. Antes de fazer o filme, Bette havia assinado um contrato para fazer quatro filmes e havia pedido para Jack Warner, poder de escolha de roteiro. Warner recusou o pedido de Bette e lhe impôs que fizesse o filme. "A Filha de Satanás" era um desastre esperado. Foi um fracasso de crítica e bilheteria e Bette amargou diversas críticas recheadas de sarcasmo e ironias. Cansada do regime autoritário de Warner, Bette pediu rescisão do contrato e foi prontamente atendida. Graças a isso, ela pôde no ano seguinte, dar vida à Margo Channing em "A Malvada" (All About Eve), um grande sucesso de crítica e bilheteria.
Mesmo não tendo mais Bette e nem Joan em seu cast de estrelas, Jack Warner queria realizar o sonho de reunir as duas rivais em uma produção e isso aconteceu com "O que Terá Acontecido à Baby Jane" (What Ever Happended to Baby Jane?) de 1962. Era nítido que a intenção de Warner era de além de ridicularizar as duas atrizes, também promover um circo midiático em torno da rivalidade das duas. O circo midiático Warner conseguiu montar, porém não conseguiu ridicularizar as duas atrizes. Mesmo com bastidores repletos de lendas urbanas, sobre embates entre Bette e Joan, o filme fez um sucesso inesperado e garantiu à Bette a sua última indicação ao Oscar. O filme deu um novo fôlego para as carreiras de Bette e Joan e o público acolheu as personagens e as atrizes, ao invés de ridicularizá-las.
Bette seguiu sua carreira, fazendo filmes e especiais para a televisão, só parando meses antes de sua morte em 6 de outubro de 1989, aos 81 anos. Jack Warner se aposentou na década de 60 e viria a falecer em 9 de setembro de 1978, aos 86 anos. Em uma entrevista Bette fez um pequeno resumo das lutas que travou durante toda a sua carreira: "Eu sabia que, se continuasse a aparecer em filmes medíocres, não teria nenhuma carreira pela qual valesse a pena lutar".
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